quarta-feira, 20 de outubro de 2010

África do Sul - Síndrome Pós-Tramático de um Contencioso Administrativo em Construção

Face à proposta colocada pelo Professor Vasco Pereira da Silva, irei de forma breve e muito condensada, analisar a respectiva evolução histórica do Contencioso Administrativo em África do Sul e explicar as razões da escolha deste regime.




Intodução:



Primeiramente, cumpre sucintamente explicar as razões da escolha deste país para o presente trabalho. Na senda do já exposto, em aulas anteriores, no que respeita à história e evolução do Contencioso Administrativo e à subjacente dualidade de jurisdições de tipo francês em contraposição ao sistema monista de tipo britânico, consideramos de especial interesse vislumbrar, a evolução nesta área que se terá verificado na África do Sul.

Importa mencionar que tal escolha deste regime reside no facto do país em causa ter sido alvo de uma longa colonização europeia, nomeadamente holandesa a partir do ano de 1652, e inglesa em finais do século XVIII.

Desta feita, o Direito sul-africano aparece, multiculturalmente, a partir do Direito romano-holandês mercantil (oriundo da Companhia das Índias holandesa) e do Direito inglês comum (british common law), para além da influência do costume de origem indígena.

Já mais recentemente, no século XX, é de primordial importância para a história desta nação o regime do Apartheid, que se instaurou legal e efectivamente nos finais da década de 40, estendendo-se até à década de 90. O Apartheid preconizava uma violenta política de segregação racial e de supremacia branca "Afrikaner" (descendentes brancos dos colonos europeus) sobre os cidadãos de raça negra, mestiços e indianos (introduzidos no país como escravos), forçados a viver circunscritos em reservas ou regiões próprias denominadas Batustões e interditos de aceder às regiões ditas brancas. O governo, Afrikaner, controlava tudo, desde habitação, saúde, educação.

Como principal representante contra o regime de Apartheid, surge Nelson Mandela, guerrilheiro do ANC, tendo sido condenado pelo governo em 1962 a prisão perpétua, tendo vindo a ser libertado apenas em 1990.

As primeiras eleições livres na África do Sul aconteceram em 1994, tendo sido Nelson Mandela eleito presidente. Já a Constituição sul-africana foi aprovada apenas em 1996.

Ora, sendo este, um país onde se verifica uma enorme diversidade étnica, cultural e religiosa e para além de toda a sua história, trata-se de um país que desperta indubitavelmente a curiosidade sobre o seu Direito e, no que interessa aqui expor, sobre a configuração do seu contencioso administrativo. Com tal herança genética esta democracia de parto dificil e adolescência problemática, terá, sem qualquer dúvida, horas intermináveis de sessões de psicanálise pela frente.







O Contencioso Administrativo da África do Sul - Breve evolução histórica



Durante o Aparthei, o direito administrativo sul-africano viu-se enfraquecido e esvaziado não só pelo poder legislativo e executivo, como também por um sistema judiciário restritivo. A nova Constituição procurou libertar o país desses atavismos e catapultou-o para uma nova era no direito administrativo, que poderíamos designar de neo-administrativismo sul-africano. Pela primeira vez na história do Direito da África do Sul, a Constituição confere quatro direitos de particular importância para o contencioso administrativo sul-africano, são eles:
1) Reforço dos direitos constitucionalmente protegidos;
2) Direito a ter os litígios dirimidos por um tribunal ou outra entidade independente;
3) Direito ao acesso à informação detida pelo governo;
4) Direito à justiça administrativa.

Por outro lado, a Constituição prevê também a criação de entidades estaduais para melhor prosseguir os ideais democráticos em si plasmados, tais como a figura do "Public Protector" que equivale ao nosso Provedor de Justiça (art. 23º CRP), encarregue de investigar e proteger os cidadãos contra a má administração do Governo ou conduta imprópria.
Outra das novidades reside na criação de uma Comissão de Direitos Humanos e uma Comissão para a igualdade no género. Estas Comissões podem exercer os seus poderes investidos no auxílio dos cidadãos que considerem que um acto administrativo do governo infringiu os seus direitos.

O Actual Contencioso Administrativo Sul-Africano

O novo Contencioso Administrativo deve servir o ideário democrático e as virtudes de uma administração que toma decisões ponderadas; prevenir a arbitrariedade no exercício do poder público; assegurar abertura, justiça e justeza de decisões. Considera-se como sendo medidas essenciais para a legitimação e confiança na administração, promovendo a participação dos cidadãos numa proximidade entre estes e as tomadas de decisão do governo.
Para dar cumprimento a estes preceitos constitucionais, em 2000 foi aprovado o PAJA que visava regulamentar a forma como as decisões administrativas em relação aos particulares devem ser tomadas e sempre conciliadas com o preceituado naquela Lei Fundamental.
Contudo, não existindo um Tribunal Administrativo autónomo, como acontece em Portugal e em muitos outros países, os litígios de cariz administrativo são resolvidos pelo tribunal comum onde impera e se aplicará o regime da Common Law. Ainda assim, as decisões são susceptíveis de Revisão Judicial ou recurso interposto a pedido do particular.

Conclusões

A criação por parte da Constituição Sul-Africana de duas Comissões cujo fim é o de zelar pelos direitos que as dominam nos termos descritos, constitui uma novidade que consideramos bastante peculiar, por exemplo, em Portugal um particular não pode invocar directamente perante o Tribunal Constitucional que um qualquer acto administrativo lhe viola um direito fundamental.
A maior parte dos cidadãos sul-africanos ainda não tem uma clara noção da existência do PAJA que dá exequibilidade aos seus direitos constitucionalmente previstos, para o que serve ou como se utiliza pragmaticamente.
Não obstante o Contencioso Administrativo encontra-se ainda em fase extremamente embrionária, no cômputo geral o avanço e o salto qualitativo em tão pouco tempo a nível de legislação é de louvar e digno de uma atenção especial quanto ao seu desenvolvimento e evolução vindouros.


Teresa Dias Morgado
140107027




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