sábado, 23 de outubro de 2010

Sistema do Contencioso Administrativo Brasileiro

Enquadramento histórico

Desde os primórdios da civilização até a Idade Média, o ramo do Direito Administrativo encontrava-se “trancado” nas mãos de uma única pessoa, o soberano, o mundo vivia assim, sob o regime das monarquias absolutas, onde o rei jamais poderia ser submetido a qualquer julgamento estando os seus actos acima de qualquer ordenamento jurídico. Em 1789 dá-se a Revolução Francesa que provocando diversas e profundas alterações sociais e políticas, derruba a realeza e abre caminho para a criação de um Direito passa a equacionar a vontade dos súbditos.

Neste evoluir, com a expansão dos efeitos da revolução francesa e o seu contágio por todo o mundo, começa no século XIX o período que iniciou o desenvolvimento do Direito Administrativo. De notar que, esse desenvolvimento não seguiu sempre a mesma orientação e nesse contexto irei falar do caso específico do Brasil, que muitos consideram ter um sistema conciliador (entre o sistema francês e o anglo-saxónico).


O Sistema Administrativo Brasileiro de Jurisdição una:

· Pecado Original:

Em 1789, o Brasil era ainda uma colónia portuguesa mergulhada uma economia voltada para atender as necessidades da metrópole e uma sociedade escravista. O contraste entre a forma de vida dos portugueses e as mudanças na Europa e nos Estados Unidos, mostravam que a crise na colónia portuguesa seria inevitável. Na base desse mesma crise encontravam-se três momentos históricos, que também serviram de marco para o início da idade contemporânea.

O primeiro foi a chamada Revolução industrial, que teve início em Inglaterra no século XVIII e, que se deveu ao crescimento da indústria conjugado com o aumento da necessidade de mercados consumidores, o que por vez serviu para o rompimento do pacto colonial e o estabelecimento do livre comércio.

Em segundo lugar a Independência dos Estados Unidos, que adoptou como forma de governo a República e serviu de estímulo para outras colónias que ansiavam mudança, reclamando igualdade de direitos e o fim do abuso de poder por parte da nobreza.

Em 1789, ocorreu o terceiro e determinante momento histórico, a Revolução Francesa que, destruiu o Antigo Regime. A colónia portuguesa não ficou imune a todas as influências sociais, económicas e políticas provocadas por estes três momentos da história mundial, acabando estas por servir de base à formação de grupos contrários à dominação colonial, que pela primeira vez colocaram em causa o poder vigorante.


O ponto de partida para a elaboração do Direito Administrativo no Brasil aconteceu no dia 11 de Agosto de 1827, através da Lei 2ª, através da qual foram criadas cursos jurídicos e instaladas as Faculdades de Direito de São Paulo e Olinda. Em 1851, passou a ser obrigatório o estudo do Direito Administrativo, como matéria curricular (Decreto nº 608). No ano de 1857 foi publicada a primeira obra de Direito Administrativo, sob o título Elementos de direito administrativo brasileiro comparado com o direito administrativo francês, de autoria de Vicente Pereira do Rego.

A partir desse momento, o Direito Administrativo desenvolveu-se e consolidou-se com influência francesa, italiana e alemã.


· Baptismo:

O culminar dos momentos históricos acima referidos e da consequente expansão dos efeitos da revolta francesa a todo o mundo originaram assim, o fim da submissão ao poder imperial, com o chamado “Grito do Ipiranga” (mesmo contra a vontade do Príncipe D. Pedro) em 1822 e verificando-se a consagração prática de uma nova fase política.

A primeira consagração do modelo administrativo característico de um Estado Social de Direito ocorreu em 1891, com a adopção do sistema de jurisdição única, segundo o qual todos os litígios, independentemente da parte envolvida, (demonstração do passo dado no sentido da igualdade de facto) seriam resolvidos perante o poder Judiciário. Assim, as causas que envolvessem directamente actos da Administração seriam da responsabilidade das instâncias do Poder Judiciário. Não há, portanto, espaço para se falar em contencioso administrativo no Brasil, nos mesmos moldes em que ele se desenvolve em França, não sendo contudo de considerar que há uma impossibilidade de conjugação entre “contencioso administrativo e jurisdição una”.

Este sistema uno (ou o chamado sistema inglês), assenta na hierarquização dos tribunais para que possa existir revisão da decisão tomada caso as partes decidam intentar recursos e caso as decisões sejam passíveis de poderem ser recorridas. Seguindo as palavras de Hely Lopes Meirelles (jurista brasileiro, considerado um importante marco da doutrina administrativa): “o sistema de controlo judicial é aquele em que todos os litígios (de natureza administrativa ou de interesses exclusivamente privados) são resolvidos judicialmente pela Justiça Comum, ou seja, pelos juízes e tribunais do Poder Judiciário."


· Crisma/consagração – dividida em duas fases: 1ª. Constitucionalização e 2ª. Europeização

1ª Fase – Constitucionalização:

Ao contrário do ocorrido na França, parece não ter sido adoptada pelos constituintes brasileiros a interpretação feira por Montesquieu que assentava na premissa de que os poderes seriam meras funções, prova disso foi a “A Carta Política de 1988”, que se apresentou como a primeira experiência democrática após mais de 20 anos de regime autoritário e se apresentou como a reconfirmação da natureza jurisdicional do contencioso administrativo (embora diferente do modelo de contencioso originário francês).

Esta mesma Carta ou Constituição da República Federal reflectiu claramente a adesão a uma ampla definição de Estado Democrático de Direito, dando especial relevo à dimensão subjectiva, isto é, à efectiva e eficaz protecção dos cidadãos enquanto particulares, incluindo assim um extenso rol de direitos e garantias individuais e colectivas (artigo 5º), que limitando a interferência do poder do Estado quer na vida do cidadão quer no que respeita à sua dignidade, lhes confere o afastamento oficial dos longos anos de autoritarismo.

Actualmente, o Brasil continua a direccionar a sua política com base na Constituição da República Federal ou Carta Política de 1988 (sujeita ao longo dos anos a sucessivas revisões), que impede nos termos do sistema administrativo adoptado após a descolonização, que haja um qualquer litígio ou qualquer causa, não sejam analisados ou decididos pelo poder judiciário.

2º Fase: Europeização

Seguindo a sistematização apresentada pelo professor no seu livro e que serve de base à historicidade apresentada, não faz neste caso sentido desenvolver esta fase, uma vez que o Brasil não faz parte da União Europeia, não havendo meios de comparação como se de um país membro se tratasse. Não ignorando os existentes acordos entre o mesmo e instituições comunitárias da União Europeia.


Conclusão crítica:

Olhando para o modelo de Contencioso Administrativo originário da revolução francesa e o sistema de jurisdição una (ou sistema inglês), parece impossível a sua conjugação, contudo, ela torna-se passível de ser dada de forma positiva se tivermos em conta a importância da parte sujeita a jurisdição, e que no fundo, todo o processo é orientado para a salvaguarda dos seus interesses, sendo esse objectivo comum a ambos os sistemas ou modelos.


Nº140107095 - Ana Rita Antunes


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